terça-feira, agosto 22, 2006

Sérgio Buarque de Holanda

O Historiador escreve sobre seu filho Chico Buarque



A imagem que o público fixou de meu filho não é correta. Para o público, Chico é tímido (antes de tudo, tímido), bonzinho, retraído. Nada disso. Pelo menos em família e com os amigos, é completamente diferente, um rapaz brincalhão, extrovertido, bem para fora. Quando ele aparece em público, torna-se diferente. Talvez seja o medo de parecer ridículo. Mas podem crer, ele não é tímido, nem bonzinho. É, sem dúvida, uma boa pessoa. Mas não bonzinho, no sentido em que esta palavra é interpretada. Quando criança, jamais foi um rebelde. Posso assegurar que se tratava de uma criança normal. Procurava sempre ser independente. E essa independência ele afirmava, procurando fazer tudo o que faziam os irmãos mais velhos. Nem um "amor de criança", nem um "enfant terrible". Normal. Não era nem ligado ao pai nem à mãe. Dava-se bem com todos. Com as irmãs, tias e avós. Quando viajamos para a Itália (nesse tempo tinha 8 anos), deixou para avó um bilhete: "Avó, vou para Itália. Quando eu voltar, provavelmente a senhora estará morta. Mas não se preocupe. Eu vou me tornar um cantor de rádio. É só a senhora ligar o rádio do céu que vai me escutar". Desde menino, sempre se interessou por música e futebol. Jogo, não perdia uma irradiação. Seus ídolos eram Telê, do Fluminense, e Pagão, do Santos. Na Itália, torcia pelo Genoa. Da música popular, seus ídolos eram Ismael Silva, Caymmi e Ataulfo Alves. Mas tarde, João Gilberto, de quem procurava imitar o estilo. Não acredito que Noel exerça influência sobre Chico. A maior semelhança entre os dois é a temática: urbana. Caymmi, Ataulfo e Ismael marcaram mais que Noel. Chico também não é um compositor de classe média, como afirmam por aí. Não há dúvida, Noel e Chico também se assemelham um pouco, porque ambos enfocam temas urbanos. Nada mais. Aliás, há no Brasil uma mania de Noel! Qualquer compositor que surge é imediatamente comparado com o grande criador carioca. Creio que há um pouco de exagero em tudo isso. Quando surgiu a bossa-nova, Chico se encontrou com ela. Apreciava muito João Gilberto e ouvia-o seguidas vezes. Viníncius, muito amigo da família, aparecia sempre em festas e Chico ficava a ouvi-lo, com grande admiração. Desde cedo, Chico já tinha namorada. Sempre foi muito vivo e alegre. Jogava futebol nas ruas, como todos os garotos de sua idade. Quanto aos estudos, dedicava-se a eles principalmente às vésperas de exame. Estudava duas ou três horas seguidas, depois cansava e ia se divertir. Em 1962, quando terminou o curso científico, foi orador da turma, provocando muitas risadas com seu discurso cheio de humor. O sucesso não o mudou essencialmente, chateia-o um pouco, apenas. Hoje, não pode sair às ruas sem que lhe venham pedir autógrafos. Para ir à praia, há dificuldades, só em São Conrado. Bem longe. Continua fiel aos amigos, embora não tenha muito tempo para se dedicar a eles. Assim que chega a são Paulo, telefona para todos, organiza noitada com eles. Chico sempre viveu em bando, com muitos amigos, uma verdadeira turma. Sua formação é, sem dúvida, paulista. Nasceu no Rio, mas quando completou 2 anos, mudamos para São Paulo. Aqui, passou toda sua infância. Preferiu fazer o científico porque achava que o curso clássico era coisa de mulher. Dado momento, escolheu um ramo bem aproximado do artístico: arquitetura. Ficava em casa criando cidades imaginárias. Todas tinham uma fonte no meio da praça: lembrança das fontes de Roma, onde moramos algum tempo. Chico, em vez de começar a falar, cantou. Desde que tentou se expressar foi através da música. Mas tarde, ficava com as irmãs aí pela sala, inventando música. Dizia que já que não conhecia de cor música de outros compositores, era obrigado a inventar as próprias. O sucesso veio de repente, sem que ninguém esperasse. Recebi a notícia de que Chico tinha ganho o Festival de Música Popular Brasileira com "A Banda", quando estava em Nova York. Um jornal norte-americano publicou a notícia. Claro que me senti muito orgulhoso. Cheguei à conclusão - o que uma revista publicou na época - de que, antes, ele era meu filho. E depois do festival eu passei a ser o pai dele. Não há posição melhor. Têm surgido boatos por aí, de que eu componho as músicas para ele. Mas, meu Deus, quem sou eu para ter tanto talento? Se eu soubesse escrever músicas como ele, há muito tempo não seria eu mesmo, mas Chico Buarque de Holanda. São boatos sem fundamentos, como muitos que vão por aí. Como essas notícias que circulam, afirmando coisas que jamais afirmamos. Um jornal carioca publicou que, após ver a peça "Roda Viva", eu tinha dito: "eu sabia que havia tudo isso aí dentro do meu filho". A frase talvez pudesse ter sido dita por mim, mas que não disse, não disse. Das suas músicas todas, gosto mais de "A Banda", "Pedro Pedreiro", "Roda Viva" e "Carolina". Nunca me esquecerei do dia em ouvi "A Banda" pela primeira vez, em Nova York, na casa de um amigo. Foi uma grande emoção. Não obstante todo o sucesso, o qual não lhe provoca muito prazer, é bem capaz de Chico largar tudo isso e partir para uma outra coisa qualquer, bem diferente. Ele é bem capaz disso. Muito inquieto. Muito inteligente. Sempre gostou muito de ler. Guimarães Rosa é um de seus autores preferidos. Quando fez "Pedro Pedreiro", inventou uma palavra: penseiro. Talvez inspirado em Guimarães Rosa, que também era dado a inventar palavras. Tolstoi e Dostoiévski também eram seus favoritos. Assim como Kafka. Em geral, ele ia lendo tudo o que caía em suas mãos. A música é responsável por ele ter abandonado o curso de arquitetura, decisão que tomou sozinho. O sucesso abriu uma impossibilidade de estudar. Excesso de compromissos, solicitações. Creio que, na música, ele se realiza mais, se torna muito mais feliz. É preferível um compositor realizado, que um arquiteto frustado, como todo mundo sabe. Quando vai compor, geralmente fica isolado, no quarto, sozinho. A música e a letra sempre nascem juntas, uma ligada à outra, indissoluvelmente. Encontrou grande dificuldade em musicar "Morte e Vida Severina", porque a letra não era sua. Desde que aprendeu a tocar violão, com sua irmã Heloisa, hoje casada com João Gilberto e morando em Nova York, nunca mais deixou de compor. Sua adolescência foi normal, sem nenhum conflito especial. Posso considerá-lo um rapaz feliz. Suas primeiras composições falavam de amor. Mais tarde, quando ingressou na faculdade, passou a fazer música de participação, sendo que a primeira foi "Pedro Pedreiro". A família ficou um pouco tonta com o sucesso tão fulminante, tão rápido. Mas já nos acostumamos. Chico é que não se habituou a ele. Ficou muito contente de ter ido a Paris, porque ninguém o conhecia por lá. Talvez o sucesso tenha provocado uma espécie de defesa, tornando-o um pouco retraído. De fato, meu filho não é tímido. É bem diferente a imagem que temos dele. Trata-se de uma pessoa normal, alegre, sem problemas graves de personalidade. Eu sei o que eu estou falando. Sou seu pai há 23 anos.

O texto de Sérgio Buarque de Holanda sobre seu filho Chico foi escrito originalmente para o nº1 da revista "Pais e Filhos", (setembro de 68). O grande sucesso de Chico naquele ano seria a peça "Roda Viva", que estreou em janeiro. Em julho, o CCC (Grupo de Caça aos Comunistas) destruiria seus cenários e agrediria os atores. E posteriormente, a Folha de S. Paulo publicou em 19 de outubro de 1991.

terça-feira, agosto 15, 2006

Cartas sobre a composição de Valsinha (Vinícius de Moraes/Chico Buarque)

DE VINÍCIUS DE MORAES
PARA CHICO BUARQUE

Mar del Plata, 24 de janeiro de 1971

Chiquérrimo,
Dei uma apertada linda na sua letra, depois que você partiu, por que achei que valia a pena trabalhar mais um pouquinho sobre ela, sobre aqueles hiatos que havia, adicionando duas ou três idéias que tive. Mandei-a em carta a você, mas Toquinho, com a cara mais séria do mundo, me disse que Sérgio [Buarque de Hollanda] morava em Buri, 11, e lá se foi a carta para Buri, 11. Mas, como você me disse no telefone que não tinha recebido, estou mandando outra para ver se você concorda com as modificações feitas. Claro que a letra é sua, e eu nada mais fiz que dar uma aparafusada geral. Às vezes o cara de fora vê melhor essas coisas. Enfim, porra, aí vai ela. Dei-lhe o nome de "Valsa hippie", porque parece-me que tua letra tem esse elemento hippie que dá um encanto todo moderno à valsa, brasileira e antigona. Que é que você acha? O pessoal aqui, no princípio, estranhou um pouco, mas depois se amarrou na idéia. Escreva logo, dizendo o que você achou.

Um dia ele chegou tão diferente do seu jeito de sempre chegar
Olhou-a dum jeito mais quente do que comumente costuma olhar
E não falou mal da poesia como mania sua de falar
E nem deixou-a só num canto; pra seu grande espanto disse: vamos nos amar...
Aí ela se recordou do tempo em que saíam para namorar
E pôs seu vestido dourado cheirando a guardado de tanto esperar
Depois os dois deram-se os braços como a gente antiga costumava dar
E cheios de ternura e graça foram para a praça e começaram a bailar...
E logo toda a vizinhança ao som daquela dança foi e despertou
E veio para a praça escura, e muita gente jura que se iluminou
E foram tantos beijos loucos, tantos gritos roucos como não se ouviam mais
Que o mundo compreendeu
E o dia amanheceu em paz.

*****
DE CHICO BUARQUE
PARA VINÍCIUS DE MORAES

Caro poeta,
Recebi as duas cartas e fiquei meio embananado. É que eu já estava cantando aquela letra, com hiato e tudo, gostando e me acostumando a ela. Também porque, como você já sabe, o público tem recebido a valsinha com o maior entusiasmo, pedindo bis e tudo. Sem exagero, ela é o ponto alto do show, junto com o "Apesar de você". Então dá um certo medo de mudar demais. Enfim, a música é sua e a discussão continua aberta. Vou tentar defender, por pontos, a minha opinião. Estude o meu caso, exponha-o a Toquinho e Gesse, e se não gostar foda-se, ou fodo-me eu.
"Valsa hippie" é um título forte. É bonito, mas pode parecer forçação de barra, com tudo que há de hippie por aí. "Valsa hippie" ligado à filosofia hippie como você a ligou, é um título perfeito. Mas hippie, para o grande público, já deixou de ser filosofia para ser a moda pra frente de se usar roupa e cabelo. Aí já não tem nada a ver. Pela mesma razão eu prefiro que o nosso personagem xingue ou, mais delicado, maldiga a vida, em vez de falar mal da poesia. A sua solução é mais bonita e completa, mas eu acho que ela diminui o efeito do que se segue. Esse homem da primeira estrofe é o anti-hippy. Acho mesmo que ele nunca soube o que é poesia. É bancário e está com o saco cheio e está sempre mandando sua mulher à merda. Quer dizer, neste dia ele chegou diferente, não maldisse (ou "xingou" mesmo) a vida tanto e convidou-a pra rodar. Convidou-a pra rodar eu gosto muito, poeta, deixa ficar. Rodar que é dar um passeio e é dançar. Depois eu acho que, se ele já for convidando a coitada para amar, perde-se o suspense do vestido no armário e a tesão da trepada final. "Pra seu grande espanto", você tem razão, é melhor que "para seu espanto". Só que eu esqueci que ia por itens. Vamos lá:
Apesar do Orestes (vestido de dourado é lindo), eu gosto muito do som do vestido decotado. É gostoso de cantar vestidodecotado. E para ficar dourado, o vestido fica com o acento tendendo para a primeira sílaba. Não chega a ser um acento, mas é quase. Esse verso é, aliás, o que mais agrada, em geral. E eu também gosto do decotado ligado ao "ousar" que ela não queria por causa do marido chato e quadrado. Escuta, ô poeta, não leva a mal a minha impertinência, mas você precisava estar aqui para ver como a turma gosta, e o jeito dela gostar dessa valsa, assim à primeira vista. É por isso que estou puxando a sardinha mais para o lado da minha letra, que é mais simplória, do que pelas suas modificações que, enriquecendo os versos, talvez dificultem um pouco a compreensão imediata. E essa valsinha tem um apelo popular que nós não suspeitávamos.
Ainda baseado no argumento acima, prefiro o abraçar ao bailar. Em suma, eu não mexeria na segunda estrofe.
A terceira é a que mais me preocupa. Você está certo quanto ao "o mundo" em vez de "a gente". Ah, voltando à estrofe anterior, gostei do último versos onde você diz "e cheios de ternura e graça" em vez de "e foram-se cheios de graça". Agora, estou pensando em retomar uma idéia anterior, quando eu pensava em coloca-los em estado de graça. Aproveitando a sua ternura, poderíamos fazer "Em estado de ternura e graça foram para a praça e começaram a se abraçar". Só tem o probleminha da junção "em-estado", o "em-e" numa sílaba só. Que é o mesmo problema do "começaram-a". Mas você mesmo disse que o probleminha desaparece dependendo da maneira de se cantar. E eu tenho cantado "começaram a se abraçar" sem maiores danos. Enfim, veja aí o que você acha de tudo isso, desculpe a encheção de saco e responda urgente. Há um outro problema: o pessoal do MPB-4 está querendo gravar essa valsa na marra. Eu disse que depende de sua autorização e eles estão aqui esperando.
Eu também gostaria de gravar, se o senhor me permitisse, por que deu bolo com o "Apesar de você", tenho sido perturbado e o disco deixou de ser prensado. Mas deu para tirar um sarro. É claro que não vendeu tanto quanto a "Tonga", mas a "Banda" vendeu mais que o disco do Toquinho solando "Primavera". Dê um abraço na Gesse, um beijo no Toquinho e peça a Silvana para manndar notícias sobre shows etc. Vou escrever a letra como me parece melhor. Veja aí e, se for o caso, enfie-a no ralo da banheira ou noutro buraco que você tiver à mão.

Um dia ele chegou tão diferente do seu jeito de sempre chegar
Olhou-a dum jeito muito mais quente do que sempre costumava olhar
E não maldisse a vida tanto quanto era seu jeito de sempre falar
E nem deixou-a só num canto, pra seu grande espanto convidou-a pra rodar

Então ela se fez bonita como há muito tempo não queria ousar
Com seu vestido decotado cheirando a guardado de tanto esperar
Depois os dois deram-se os braços como há muito tempo não se usava dar
E cheios de ternura e graça foram para a praça e começaram a se abraçar

E ali dançaram tanta dança que a vizinhança toda despertou
E foi tanta felicidade que toda a cidade enfim se iluminou
E foram tantos beijos loucos
Tantos gritos roucos como não se ouvia mais
Que o mundo compreendeu
E o dia amanheceu
Em paz.

quinta-feira, agosto 10, 2006

"... o meu amor me chamou pra ver a Banda passar cantando coisas de amor..."

Sim, nós aprovamos Benjamim e Budapeste, as duas últimas obras literárias de Chico.
Porém, nunca foi tão esperado (7 anos!) uma nova temporada de shows e novas canções.
Finalmente Carioca está ai! E dia 30 de agosto inicia a nova turnê que irá até junho de 2007, começando por São Paulo na casa Tom Brasil. Haverá apresentações também em Campinas, Ribeirão Preto, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife e Salvador.
Além das canções do novo trabalho, o repertório apresentará outras canções da autoria de Chico nunca tocadas ao vivo anteriormente.
Para muitos fãs o preço do ingresso está bem sem graça. Os mais baratos são lugares péssimos do Tom Brasil, no fundão, encostado na parede.
E para a alegria de muitos o Tom Brasil está com a PROMOÇÃO BACKSTAGE CHICO.
Para participar basta responder a pergunta: O que você faria para ver o Chico?
O sortudo que der a melhor resposta ganhará um par de ingressos e participará da passagem de som no do dia 29 de agosto.
Provavelmente, devido ao enorme número de fãs, o artista não abrirá o camarim. E essa é a oportunidade de estar perto do ídolo.
O resultado será divulgado dia 27 de agosto no site do Tom Brasil.
Bora lá participar! E que vença o mais criativo!

Site do Tom Brasil - www.tombr.com.br

segunda-feira, agosto 07, 2006

Apresentação

Sou fã de Chico Buarque, como já é do conhecimento de todos.
Além de gostar de suas composições musicais também sou admiradora de suas obras para o teatro e seus livros.
Minha admiração está em um nível tão alto que de tando escutar suas músicas cheguei a deixar as pessoas da minha casa enjoadas de Chico Buarque.
E agora, com a nova turnê, é uma época em que os fãs estão "a flor da pele".
Procurei um blog sobre a vida e a obra desse grande artista, mas não achei nenhum com muitas informações. Os poucos que encontrei estavam abandonados. Então resolvi criar esse blog como um espaço democrático de divulgação para criar contato entre fãs de todo o mundo e que possamos trocar informações.
Pretendo postar no mínimo duas vezes por semana e conto com o colaboração de todos os amigos Chico-maníacos como eu.